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quarta-feira

Na reportagem exibida pelo Bom Dia Brasil, e nos noticiários da GloboNews no decorrer do dia, o assunto voltava, ameaçador: A falta de mão de obra especializada no Brasil, e a possibilidade de apagão no mercado de trabalho.

Analistas de RH, acadêmicos, analistas de mercado, todos, unânimes em apontar para o crescente hiato que vai se formando entre vaga e profissional disponível.

As universidades formam profissionais com grade disciplinar obsoleta, as novas tecnologias demoram a ser digeridas e sistematizadas, as informações circulam nos meios empresariais de forma surpreendentemente rápida e no fim, os professores fingem que ensinam, os alunos fimgem que aprendem. E tudo vai por água abaixo na primeira entrevista de emprego.

Saem sem a menor perspectiva concreta de carreira e sem vivências úteis, pois os estágios geralmente posicionam os profissionais em funções de suporte pouco interadas com o aprendizado.

Queria só destacar aqui que não vejo, nesse caso, culpa nos professores universitários. Eles seguem diretrizes das suas instituições e, portanto, as limitações delas.

A culpa também não é da sociedade do conhecimento, da pós-modernidade, do Dalai Lama, não há culpados aqui. Há os que não estão percebendo o momento histórico em que nos encontramos - e isso é no mundo todo.

Somos uma Pangea, novamente. Praticamente, caminhamos para um padrão de vida relativamente próximo, nos centros urbanos. As mesmas marcas, mesmas metas, mesmas carreiras, tudo it´s same.

O que realmente não restará, pedra sobre pedra que nao seja derrubada, é esse modelo de RH que temos hoje, atrasado, especializado - não em pessoas, não em empresas competitivas - mas na década de 80 e, quando muito, 90.

O RH brasileiro pensou que essas décadas durariam para sempre.
E sentou-se, confortável em sua cadeira-diretor de couro marrom-cafona, esperando que, ao oferecer uma vaga, os currículos chegassem brilhando em papel couchê, borrifados de perfume e com 8 páginas de qualificações internacionais.

E tão surreal que dá dó.
Aliás, por falar em surrealismo, essa semana tivemos o Brite 2011, encontro de turismo realizado no Rio de Janeiro. 
Alguns amigos foram e resolvi perguntar a um deles no Twitter sobre o que seria, se haveria uma pauta para inclusão de assuntos ligados a mão de obra da favela. Fui respondido por uma outra pessoa (moral: no Twitter, e na vida, responda apenas o que for perguntado a você) e a resposta foi que, para um encontro de turismo no Rio, ter pauta sobre favela seria surreal.

Surreal:
Classificação morfossintática:
- [surreal] adjetivo masc singular .
- [surreal] adjetivo fem singular .
Sinônimos: irreal inacreditável exótico diferente implacável inimaginável .
Antônimos: real explicável .
Palavras relacionadas: bizarro louco transgressor imaginário irreal algo não real irado insano .


Entende?
Numa cidade em que metade dela, algo como 6 milhões de habitantes, moram em favelas, falar da inclusão das favelas no mercado de trabalho é surreal. 
Seja porque o mercado brasileiro acredita que está na Alemanha, seja por pura e simples alienação, porque "favelado precisa é de polícia, não de emprego", eu fico pensando que, se já está difícil pra quem pode investir em sua educação, quanto mais para os que não podem? Quando as empresas vão se conectar às universidades para formar inside seus profissionais?
Existe um país, juro que existe, de nome Estados Unidos, não muito longe daqui, presidido por um negro de sorriso muito simpático, onde o regime de mercado chama-se capitalismo, coisa que ainda não conhecemos, no qual as universidades e empresas se comunicam intensamente sobre a formação dos profissionais.
Mais: quando vão incluir a mão de obra vinda de camadas de baixa renda? Qual será o legado de 2014 e 2016? Os moradores de comunidades não terão acesso a emprego especializado? Nenhuma empresa vai levantar a mão para dizer: "Alô, nós podemos treinar." porque ambas as mãos estão encalacradas em dinheiro?
Estamos falando de quê, geração Y,Z Alpha, o escambáu, que já chega em mais uma década sem oportunidade? Então morador de comunidade tem mais é que servir café e carregar mala? É essa a herança do mercado hoteleiro, que parece não se importar em mover uma moeda para absorver e treinar mão de obra? É esse o desenvolvimento prometido? É surreal ter a favela na pauta de um estado cujo principal produto é o turismo? Surreal falar de favela - classe D - que consome hoje em valores brutos mais que a classe B?

Pense por você mesmo. Principalmente se for diretor de RH, e tem interesse em manter seu valioso emprego nos próximos 5 anos.


Bom Dia Brasil


Anderson França é TED Host, e acha isso um luxo.

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