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quinta-feira

Na Redes de Desenvolvimento da Maré, 22 Set


Após a UniQuebradas, agora é a vez de realizar a palestra na Redes da Maré.

Tem uma idéia? É difícil escrever um projeto?
Passa lá!

quarta-feira

Cortina de Fumaça II

Em 6 de setembro de 2011, estive no Complexo do Alemão para acompanhar, segundo fontes do exército, o que se tratava de invasão e tiroteio provocado por traficantes fortemente armados.

Permaneci no Alemão até por volta das 3 da manhã e as 7 da manhã publiquei esse texto, que retirei do ar 2 dias depois, por recomendação de amigos, até que outro órgão ou observador informasse algo parecido.

Re-publiquei hoje e acrescento esse video, feito pela equipe no Jornal A Nova Democracia.

Já passado quase um mês, o fato despertou forte discussão na imprensa, mas até agora nenhum um suposto traficante responsável foi identificado ou preso pelo suposto tiroteio.

Cadê a favela que estava aqui?

Em abril, estive em Natal/RN, visitando algumas favelas da cidade.
Curioso, que boa parte delas estão, por assim dizer, escondidas, para alegria dos coxinhas paulistanos e de outros lugares, que vão à Natal procurando o melhor da "Cidade do Sol" e do turismo sexual - infantil.

De fato, é possivel andar por longos trechos da cidade sem encontrar nenhuma favela.
Mas,que las hay, las hay. E muitas, como vi e mostrei aqui no blog.

Fora o Rio, em que as favelas fazem "parte" do roteiro turístico, em Natal a regra é escondê-las - e não resolver os problemas da favelização com políticas públicas.

Em texto de Gilson Rodrigues feito para o Carta Potiguar, enxergamos bem mais que o retratado no folder que oferece um pacote clichê-classe média que as agências de viagem oferecem a cada verão.

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É bem provável que boa parte dos turistas que vêm a Natal, não vêem as favelas que existem aos montes pela cidade. Não é à toa, em sua maioria elas estão bem escondidas, a ponto de muitos moradores da nossa linda e maquiada “Cidade do Sol” não saberem de sua existencia. Êpa, deixe-me corrigir, faz alguns anos que perdemos esse título para a capital cearense… Agora Natal estampa em uma placa tímida na BR 101 outro título: “Noiva do Sol”.
Bem, independente do que dizem as placas e os publicitários, pensar sobre a invisibilização das favelas e bairros de periferia em Natal me fez lembrar sobre como, nestes quase dezessete anos morando por aqui, ouço as pessoas se gabarem da bela e organizada entrada da cidade. Geralmente quem fala isso tem como referencial as incômodas imagens que nos recepcionam ao entrar na capital paraibana e, ainda mais, quando chegam ao Recife. É comum ouvir: “Afff, só tem favela”. Morei durante um ano em Recife e, apesar de ter adorado a experiência, tenho de concordar, a cidade parece nos abraçar com sua indisfarçada pobreza. Há poucos anos a Prefeitura do Recife tentou realocar os moradores da Favela do Coque, mas estes não aceitaram a oferta de “casas populares” afastadas do lugar onde moravam há anos, o que afetaria bastante as redes de solidariedade e estratégias de ação desenvolvidas em décadas de convivência.
Não saberei explicar detalhadamente os motivos de não ver tanta resistência (se é que se pode chamar assim) semelhante em nossa cidade. Talvez se dê, ao menos em parte, pelos tão diferentes processos históricos, sociais e culturais que deixaram marcas indeléveis na formação de natalenses e recifenses. Mas, com exceção de alguns representantes do Movimento Ocupa, podemos observar facilmente (quem quiser) um processo de invisibilização social e demonização desta pobreza indesejável aos olhos em nossa cidade. Evidentemente isto não é “privilégio” nosso, pode ser observada na maioria das grandes cidades ao redor do mundo.
No entanto gostaria de dar destaque para um caso bastante recente ocorrido em nossa cidade: o desaparecimento, quase que por mágica, da “Favela do Fio”, localizada na Avenida Mor Gouveia, próximo a Rodoviária… Aqueles que costumam vir seja de carro ou de ônibus, da Zona Norte da cidade pelo KM-06, em direção a Cidade Esperança, certamente passavam em frente a região. Pode-se se dizer que era a única das favelas natalenses que gozava de grande visibilidade.
Como passo semanalmente ali em frente, estava acostumado a ver naquele lugar um pequeno cenário, uma miniatura de qualquer grande favela, com seus esgotos a céu aberto, suas carroças de frete e crianças correndo descalças pelas vielas. Como antropólogo voltado para questões urbanas, mais especificamente para os efeitos da legitimação da pobreza em nosso país, sempre tive vontade de ir até ali. No entanto, se quiser conhecer a população residente, terei de primeiro investigar para onde ela foi realocada.
Não foi surpresa, apesar do choque, ter passado por ali a noite e ver ainda a favela, com seus barracos ainda fragilmente de pé e, no dia seguinte, encontrar apenas um cenário desertificado, apenas uma mistura de areia e lixo, únicos remanescentes, como que anunciando o desenraizamento das pessoas e casas dali . O que ocorreu? Mais uma ação bem sucedida da nossa atual prefeitura, que não diferente das outras, mostra seu empenho em tirar os “indesejáveis” das vistas dos “cidadãos de bem”, pessoas que produzem – “úteis” –, merecedoras do exercício da cidadania, compreendida aqui enquanto o usufruto dos direitos civis, políticos e sociais (mas que acima de qualquer coisa são “bons consumidores”). Estes, quando não desconhecidos, aparecem como completamente inatingíveis a maioria da população, especialmente aos grupos que ocupam os já referidos “lugares de relegação”, como chama o sociólogo Pierre Bourdieu, exemplificados aqui com a já extinta Favela do Fio, lugares abandonados pelo Estado em seu exercício de um “descaso planejado”.
Para esses grupos valem, cada vez mais, apenas os deveres do cidadão (vide como ouvimos falar em cidadania, principalmente, durante o período eleitoral, apenas quando a população mais miserável é chamada ao “exercício da cidadania” ou convidada a “festa da democracia”), conseqüentemente são eles quem mais sentem o peso do nosso pesado Código Penal.
Também não foi surpresa ouvir de outra aluna que teve “uma pontinha de alívio” quando viu que a favela não mais existia ali. Ela explica, meio sem graça, que tinha muito medo quando passava ali e via todas aquelas pessoas pedindo dinheiro nos carros em troca, ou não, de uma lavagem de pára-brisas… Tenho certeza que esse “alívio” não foi sentido só por ela… Pelo menos ela não exerceu, dessa vez, a hipocrisia social, presente no discurso politicamente correto, que sempre nos impele a não falar o que se pensa.
Lamentável, no entanto, perceber todo o ódio e preconceito de classe contido em seu discurso que, salvo as devidas proporções, faz coro com o discurso daqueles jovens que atearam fogo no índio Galdino: “Pensávamos que era apenas um mendigo”. No fim das contas tanto o comentário da minha caríssima discente como o desses distintos cavalheiros apontam para a mesma coisa: limpeza social.

terça-feira

Palestra sobre Projetos Culturais e Empreededorismo Social na Uniquebradas

Na Universidade das Quebradas, no Colégio Brasileiro de Altos Estudos da UFRJ, acontece hoje uma palestra que abordará os seguintes temas:

Empreendedorismo Social,
Projetos,
Inscrição de Projetos em Editais,
Sumário Executivo,
Sustentabilidade, 

Prestação de Contas e Gerenciamento de Projetos

O palestrante será Anderson França, @dinho_rio ativista social e fundador da Dharma Comunicação.

A UniQuebradas faz parte do Projeto Avançado de Cultura Contemporânea localizado na Rua Rui Barbosa, 762, Flamengo.
Veja o Mapa
Horário: 15h
Entrada Franca

As histórias que não entram nas biografias vitoriosas.

Abrir um negócio ou liderar um projeto não é definitivamente pra qualquer um.

Há setores em que uma boa idéia basta. Há setores que, além da boa idéia, um bom sistema de gestão é importante. E assim por diante. Há setores que até a vida das pessoas envolvidas conta.

Mas, não há uma banca examinadora. Não há, muitas vezes, uma análise criteriosa, segura.

Então, a idéia, a gestão, a empresa, podem ser ótimas. Mas, quando existem muitos interesses em jogo, das duas uma: Ou você muda de área, ou muda de idéia. Porque, mudar de vida não resolverá.

No terceiro setor, tenho tido, todos os dias, grandes e boas experiências. Elas acontecem em sequência, porque a idéia, a gestão e o planejamento estão bem fechados.

Mas, acredito que apenas na política, exista uma área tão ruidosa, tão densamente povoada por interesses de natureza pessoal, tão orientada por especulações e boatos, como o terceiro setor.

Muitas histórias não entram na biografia de uma marca, de uma empresa. Aqui, registro algumas que tornam quase impossíveis coisas que seriam, em outras circunstâncias, mais simples.

Por exemplo, a influência. A presença de uma pessoa influente que, com um estalar de dedos pode alavancar ou destruir uma idéia. Influência existe em todo lugar. Mas, no Rio, sobretudo nos assuntos relacionados ao terceiro setor, essa característica tem dividido pessoas em dois grupos: Os insiders e os outsiders. Tudo determinado pelo nocivo critério de quem fala o quê de você. Baseado no humor, no interesse bloquear suas idéias, na sua história, em impedir a "concorrência",  os motivos são tantos que chega ser difícil listar.

As variantes são infinitas. Então, um grupo vasto de pessoas, que deveriam ser as primeiras mais informadas sobre tudo que acontece ao seu redor, sucumbe ao medo de ser ou não aceito pelos "ômi". E nisso tudo, interesse financeiro, de projetos, dinheiro, muito dinheiro, que compra opiniões, promete o paraíso, forma grupos.

Não há imparcialidade. E isso em lugar nenhum. Não há quem possa levantar a mão e dizer: Nós somos absolutamente imparciais.

Há tosquices. Chefes que usam seus empregados como buchas, usam pessoas como peças de um tabuleiro de xadrez onde o que importa é estar na frente dos demais. Eu sei. Parece desabafo. Parece cifrado. E é.

Você tem que se preocupar com o morador que não pode falar que o Estado mente nas ocupações, com o outro morador que fala mal do primeiro morador por não falar e aquele, que fala mal deste porque fala. E ambos, que falam mal dos outros moradores porque estão na mídia, e um rancor silencioso no meio do processo, que várias coisas que deveriam ser resolvidas com um diálogo sincero não se resolvem.

Você tem lideres sabotando carreiras de pessoas, por emalis, fechando círculos de relacionamentos, exploração da ingenuidade, exploração dos meios de influência, exploração da imagem.

Tem o deslumbre do público, praticamente entorpecido pelo que vê na TV, tem a ignorância de diretores de empresas, que investem em projetos que seriam ótimos 20 anos atrás e hoje são apenas mais do mesmo.

Tem um ódio circulante, uma batalha de egos, uma crise geral de propósitos, uma necessidade de mostrar sempre um lado bem sucedido das ações, como se as favelas fossem bairros de Frankfurt ou Mônaco.

Todos, sem exceção, podemos tirar o corpo fora e dizer que apenas  o outro faz isso, mas, todos participamos em algum momento desse sistema.

Eu já vi tanta coisa, dita sobre os outros, dita sobre mim, tanta coisa estranha, que me pergunto se o que fazemos é realmente o bem. Porque, não pode vir algo bom do que é, em sua natureza, ruim.

Então, além de batalhar todos os dias por patrocínio, você ainda precisa realizar mil e uma batalhas que envolvem as demandas, os interesses, a cabeça de cada um.

Vencer essa onda é o desafio.

E por isso, desistir pode ser o caminho mais sensato. Entendo quando pessoas me ligam dizendo isso. Entendo mesmo porque dizem.
Uma lanchonete dá menos trabalho.

Há uma crise. Uma crise coletiva, de propósito. Um país com cerca de 200 mil ONGs e abrindo mais a cada dia. O que mais tem nesse país é ONG, Sindicato e Igreja. Isso mostra que há algo errado conosco, na forma como nos organizamos e queremos sanar os problemas que nos cercam.

Elegemos heróis, formamos milícias sociais, gangues, e nos importa muito que todos saibam que somos nós que fazemos isso ou aquilo, porque "isso" chama apoio, dinheiro, status.

Mas essa crise de propósito é tão grave que nos faz esquecer que na ponta estão populações faveladas, abaixo da linha de pobreza, engrossando o número de 800 milhões de favelados no mundo, pessoas sem voz, pessoas sem capacitação para o mercado e que apesar de tão miseráveis dão lucro altíssimo para tantos outros.

Como a exploração da seca no Nordeste, na década de 70 e 80. Há sempre quem lucra patacas com a miséria. Mas, isso nem é novidade. Nem denúncia. A questão é mais profunda, para o fundo mesmo. É sobre o propósito de cada um quando decidiu trabalhar nesse setor. É sobre a pureza do caminho, sobre a ética nas relações, sobre a legitimidade do trabalho.

Então, a discussão é existencial? Em parte, sim. Não tem como você querer mudar nada nesse mundo se você não começou uma revolução dentro de você. Se você não mudar, não vai mudar nada nem ninguém.

Boff insiste na redefinição de valores, em prol de um mundo justo. Redefinir família, por relacionamentos abertos e verdadeiros. Alguém pode ser o irmão que você não teve. A mãe que você não tem. Você pode ser alguém para alguém.

Dentro de uma perspectiva do acolhimento, e do que realmente estou fazendo da minha vida, é que deixo as idéias virem como um turbilhão, para fora, cada dia.

Enquanto há poeira no ar, prossigo. Trabalhando, pouco e sozinho. Refletindo muito sobre tudo que não quero me tornar.

segunda-feira

Na brincadeira sinistra de polícia e ladrão.

Tenha certeza, não foi por falta de aviso.
Em algum momento, as falhas no processo de ocupação iriam aparecer.
O comando inteiro de policiais uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), no Rio foi afastado por receber dinheiro, todo mês, para permitir a venda de drogas e a presença do tráfico na comunidade que ocupava.
Seguindo o senso comum, poderíamos agora denominar, um por um, os culpados por isso. Alguns diriam que a culpa é dos policiais. Outros que é falha do governador. Outros ainda que a culpa é dos traficantes e também dos usuários, o discurso que eles financiam o tráfico, etc.
Não se trata de eleger um culpado. Nem somente o governo é culpado, porque paga o pior salário de policial militar do país, porque instalou UPPs em condições precárias de trabalho como já foi mostrado inclusive em reportagem feita com Cecilia Olliveira, porque realiza ocupações sem planejamento algum sobre intervenções sociais, culturais, ou de desenvolvimento econômico local, fato que o que o próprio secretário de segurança José Mariano Beltrame já declarou, informando ainda que a UPP, do jeito que está, não vai resolver os verdadeiros prolbemas. Nem somente a polícia é culpada, essa polícia, a que mais mata no mundo, de criança a Juiz de Direito, mal armada, mal preparada, com uma cultura de corrupção entranhada na hierarquia da corporação desde a década de 50, e ao mesmo tempo formada por funcionários públicos, especialistas em segurança, que gostariam muito de ser mais valorizados, respeitados dentro do Estado, com a dignidade e remuneração que esse tipo de função tem em várias outras cidades. Nem o tráfico é culpado sozinho. É de se esperar que o bandido seja corruptor, ofereça as motivações para o desvio de conduta. Mas as questões sobre as drogas devem ser tratadas como assunto de saúde pública, essa discussão é ampla, se traficantes vendem, há quem compre, mas essa questão é resolvida apenas numa esfera que está além das fronteiras do Rio.
No meio dessa discussão, apenas uma pergunta me faço: Como ativistas podem ter segurança de trabalhar em comunidades ocupadas em parceria com órgãos do governo, policiais da UPP em parceria com seus projetos? Como identificar os bandidos dentro da polícia? Porque bandido é fácil de se identificar, afinal, ele fala, anda e se veste como bandido. Policial se veste como policial, fala como policial, anda como policial, mas pode ser bandido também.
Hoje, para muitos ativistas nas favelas cariocas, é mais simples trabalhar em áreas dominadas pelo tráfico do que pela polícia, pela pura e simples visualização de quem é quem.
A matéria do jornal carioca O Dia, abaixo, nos apresenta os fatos e o afastamento de todo comando da UPP. Imagine você que não é apenas uma troca de policiais para "limpar" a corporação mas uma perda significativa da pouca credibilidade que a polícia tem nas comunidades.
Uma perda que não será quantificada, mas sentida.
Faltam 996 dias para a Copa do Mundo.
Anderson França

O DIA - Após denúncia de 'mensalão', comandante de UPP é afastado


POR FRANCISCO EDSON ALVES

Rio - O comandante-geral da PM, coronel Mário Sérgio Duarte, e o chefe do Comando de Polícia Pacificadora, coronel Robson Rodrigues, anunciaram na tarde deste domingo o afastamento do comandante e do subcomandante das UPPs da Coroa, Fallet e Fogueteiro, capitão Elton Costa e tenente Medeiros. De acordo com Mário Sérgio, todos os policiais envolvidos no escândalo de corrupção serão afastados, além de outros por razões administrativas. "O único caminho que vejo para os policiais envolvidos neste esquema é a porta da rua", afirmou durante coletiva realizada no gabinete do comandante-geral, no Centro.

Coronel Mário Sérgio (D) anunciou afastamento de comandante da UPP | Foto: Carlos Moraes / Agência O Dia
O coordenador das UPPs, coronel Robson Rodrigues, disse que em menos de uma semana toda a investigação da PM sobre o caso será concluída. “Na maioria das vezes as investigações começam com denúncias. O subcomandante e o comandante serão afastados, mas isso não significa que eles estejam envolvidos no esquema. É apenas uma conveniência. Na verdade, essa é uma das primeiras medidas administrativas que serão tomadas”, afirmou Rodrigues.
Reportagem exclusiva de O DIA publicada neste domingo mostrou que a UPP do Fallet estava no caderno do tráfico. Criada para colocar um ponto final no domínio do crime organizado nos morros do Catumbi, a unidade se rendeu ao dinheiro das drogas. Um grande esquema de corrupção foi descoberto na unidade, onde propinas fixas são pagas regularmente pelos traficantes a policiais. O mensalão da UPP abastece os agentes com quantias que variam de R$ 400 a R$ 2 mil e no mês totalizam mais de R$ 53 mil.


Trinta homens da unidade são investigados por envolvimento no caixinha do tráfico. Eles foram monitorados durante um mês por policiais da Coordenadoria de Inteligência da PM. Terça-feira, três agentes foram presos pela Corregedoria — um sargento e dois soldados. Com eles, no carro, havia R$ 13,4 mil. O dinheiro estava em envelopes, que continham valores entre R$ 100 e R$ 500 e o nome dos policiais.

Pacificação chegou ao Catumbi, mas investigação mostra que grupo fez acordo com tráfico| Foto: Léo Corrêa / Agência O Dia
VALORES DIFERENCIADOS


O valor das propinas era fixado de acordo com a patente e a importância do agente na estrutura do policiamento. Durante a apuração, os policiais do Setor de Inteligência descobriram que no dia de plantão dos investigados não havia repressão ao tráfico. Os bandidos agiam livremente e vendiam drogas nos principais becos das favelas da Coroa, Fallet e Fogueteiro. Mas sem ostentar armas.
A unidade pacificadora do Catumbi tem 206 policiais e a possível ligação com as propinas do tráfico atinge 14,5% do efetivo. O comandante e o subcomandante da UPP — capitão Elton Costa e tenente Medeiros — também são investigados sobre o ‘mensalão’, que teria o sargento detido terça-feira como operador do esquema.


Seria ele a pessoa que aparece nas investigações negociando com traficantes a retirada dos PMs das áreas onde há venda de drogas nos morros e os valores da propinas. Inquérito Policial Militar, aberto no Comando da Polícia Pacificadora, será analisado esta semana pela juíza Ana Paula Pena Barros, da Auditoria da Justiça Militar, que decidirá se decreta a prisão dos PMs.


Intervenção e 30 policiais investigados afastados


O Comando de Polícia Pacificadora, que participa da investigação, resolveu na quinta-feira intervir na UPP da Coroa, Fallet e Fogueteiro. Os 30 policiais investigados pela Corregedoria da PM foram afastados, conforme a publicação no Boletim da Polícia Militar, e destacados ao batalhão de origem. Todos são recrutas e foram selecionados no ano passado por unidades do Interior do Rio (Itaperuna, Macaé, Nova Friburgo, Petrópolis e Teresópolis).


Os policiais estavam lotados na UPP Coroa, Fallet e Fogueteiro desde a inauguração da unidade, no dia 25 de fevereiro deste ano. A ideia de selecionar homens novos na carreira policial e do Interior era justamente para impedir a contaminação dos agentes com esquemas de corrupção do tráfico de drogas. Eles serão substituídos, agora, pelos novos recrutas que estão sendo formados pelo Centro de Aperfeiçoamento de Praças (Cefap).

Vítimas de atentado estava fora de esquema



A investigação do envolvimento de PMs na caixinha do tráfico levou à descoberta de que o atentado a três agentes, em junho deste ano, não foi mera coincidência. Lotados na UPP, eles estavam fora do esquema do mensalão das drogas e, em todo plantão, faziam exatamente o que se espera de um policial: tentavam prender os criminosos.


A ação dos PMs irritou os bandidos, que resolveram dar um corretivo em quem insistia em se ausentar do caderninho do tráfico: jogaram uma granada no momento em que os três agentes patrulhavam os becos do Morro do Fallet. O soldado Alexander de Oliveira foi atingido na emboscada e perdeu parte da perna direita e teve fratura do braço esquerdo. Outros dois PMs foram atingidos por estilhaços.


O trabalho dos agentes da Coordenadoria de Inteligência mostrou que nem todos os policiais da UPP estão envolvidos no esquema de corrupção. Mas um bom número de homens sabia da ligação de alguns colegas com os traficantes. O sargento e os soldados presos na terça-feira alegaram na 1ª Delegacia de Polícia Judiciária Militar (DPJM) que os R$ 13,4 mil encontrados com eles no carro não era de nenhum deles. E nem sabiam o que faziam os nomes dos agentes nos envelopes.


Controle do tráfico na cadeia


O tráfico nos morros do Catumbi é controlado por Valquir Garcia dos Santos, o Valqui. Dono de uma extensa ficha criminal — são 17 anotações —, ele é foragido do Instituto Penal Ismael Pereira Sirieiro, em Niterói, de onde saiu pela porta da frente, em fevereiro do ano passado.


O traficante ganhou o benefício da visita periódica ao lar, após ser preso, em 2005, ao ser baleado numa troca de tiros com policiais quando mantinha uma família como refém. Enquanto esteve preso, Valquir dos Santos mostrou que seu poder vai além das grades: determinou o fechamento do comércio na região do Catumbi, em luto pela morte do irmão, Valcinei Garcia dos Santos, o Caê, que foi morto pela polícia.


Toda a quadrilha responsável pelo tráfico de drogas está identificada no inquérito aberto da 6ª DP (Cidade Nova) pelo delegado Luiz Alberto Andrade e com prisão decretada pela Justiça.


Números


R$ 13.400
Valor apreendido no carro com três policiais que foram presos, após investigação. Envelopes tinham nomes de PMs


14,5%
Percentual do efetivo — de 206 policiais militares que atuam nos morros da Coroa, Fallet e Fogueteiro — que estaria comprometido com traficantes para recebimento de dinheiro


R$ 2 MIL
Valor a que chegavam as quantias pagas a cada policial para fazer vista grossa para a atuação dos traficantes. Esquema foi descoberto depois de três meses de monitoramento

quarta-feira

Cortina de Fumaça.

Era início da noite e eu conversava com Robson, responsável pelo ferfil do @NovoComplexo do Alemão, no Twitter, quando surgiram as primeiras notícias, através do @VozdaComunidade,de Rene Silva e equipe, e de @JJAfroReggae, perfil de José Junior, sobre os sons que, a princípio, foram considerados fogos de artifício.

Logo em seguida, tweets passavam a informação que eram, de fato, tiros. Por cerca de 20, 25 minutos outros perfis de moradores e movimentos sociais no Alemão confirmaram que havia um tiroteio cada vez mais intenso e chegava também a notícia que a Av. Itararé estava fechada, focos de vandalismo na Grota, pânico, soldados do exército se mobilizando em direção a Itararé, blindados do BOPE e muitos tiros.

Não se tinha muita certeza de quem estava perto do quê, que pudesse passar informações em série, ordenadas, cobrindo os acontecimentos, mesmo porque o fato tomou a todos de surpresa. Não há de se esperar que Rene Silva ou qualquer outro morador que utiliza as redes sociais no Alemão saia de casa para reportar os fatos uma vez que eles estão do lado de dentro da linha de fogo.

Usei o telefone para localizar outras pessoas em outros pontos do Complexo e a cada nova informação fui contemplando um quadro que parecia sinalizar para o fracasso absoluto da ocupação.

Ninguém absolutamente sabia dizer com clareza de onde partiam os tiros e menos ainda quem os efetuara.

As informações se repetiam a tweets do tipo "novo tiroteio e bombas nesse momento."

Aproximadamente uma hora depois das primeiras informações, já se podia encontrar uma cobertura ao vivo da Band FM e de uma equipe da Record. Já ream quase 8 da noite e, no Jornal da Band, foi exibido um vídeo de supostos traficantes no Complexo em atividade numa boca de fumo e no JN, quase duas horas depois do início do conflito, foi noticiada uma informação de que estava ocorrendo intenso tiroteio.

Não estava sendo fácil apurar informações. Os comunicadores da favela estavam em suas casas, pois foram surpreendidos com os tiros, precisavam estar local seguro. Do lado de fora da favela, ruas interditadas, cones do exército em vias principais, tornava o acesso de qualquer equipe de reportagem ao local mais demorado.

Era uma estratégia de isolamento da área e a impossibilidade de se registrar o que estava acontecendo, com imagens, com indicação das ruas, dos focos de conflito, de quantos homens estavam envolvidos e quem eram esses homens.

Esperei até 9 da noite para sair de casa, com uma amiga, e fomos de carro para as imediações da Estação de Bonsucesso, rodando até a Estação de Ramos observando as pessoas paradas em bares, procurando por informações na TV ou rádio, nos pontos de ônibus, muitos comentários e boatos, inclusive de que o Fabiano Atanásio, o FB, estaria no alto da Grota e a operação seria para capturá-lo. Vários ônibus mudando trajeto e outros motoristas aguardavam alguma informação sobre o que fazer.

Moradores do Alemão que chegavam do trabalho e de outros compromissos procuravam por informações que lhes desse alguma segurança. Já eram quase 10 da noite e ainda se ouviam tiros. Além disso, balas traçantes cruzavam o céu, tiros para o alto, que dava pra ver da passarela em Bonsucesso.

Mais viaturas da polícia passavam e a sensação de que a noite seria longa. Pelo twitter, soube que Raull Santiago, coordenador executivo do grupo Descolando Idéias, estava cobrindo o conflito, de moto, pela comunidade. Marcamos de nos encontrar em Bonsucesso. Eu não iria sozinho, levaria ainda mais outra pessoa, ligada à uma ONG de Direitos Humanos, que não apareceu.

A bateria do notebook acabando e subimos para a Itararé para pelo menos passar no local. Barricadas, cones, caminhões do exército, carros da PM, soldados revistando moradores, comércio fechado e clima tenso. Após uma hora circulando na Itararé, já por volta de meia noite, não havia mais tiroteio e não me sentia seguro para entrar na comunidade e registrar imagens, decidi voltar.

Soube que um balanço parcial dava conta de 16 feridos e um adolescente de 15 anos morto com tiro na cabeça.

Não se tinha uma idéia do tamanho real dos fatos ou das consequências.

Pouco se soube com clareza o que acontecia, mas podemos e devemos, nessas horas, trabalhar com as hipóteses do que não aconteceu - ou não deveria estar acontecendo, levando em consideração o que temos acompanhado no dia a dia: o histórico da ocupação, o episódio de domingo, a ordem dos fatos, o vídeo de supostos traficantes, os tiros para o alto e a nota do exército.

1. A ocupação do Alemão pelas Forças Armadas expulsou os traficantes e desarmou o Complexo. Essa é a versão do governo. Essa é a versão que foi transmitida pelos principais meios de comunicação. Após a expulsão dos traficantes, as tropas tomaram todos os pontos principais de observação da favela, realizaram policiamento ostensivo nas ruas principais, partiram à procura de drogas e armamentos, prenderam pessoas, invadiram casas (não havia mandado), mapearam a comunidade e, espera-se do mais ingênuo observador ao mais técnico, que qualquer análise sobre a ação dos militares resulte numa circunstância de controle da situação, qualquer controle, considerando que antes da ocupação não havia nenhum.

Aqui reside a primeira questão. Talvez um erro do governo, do exército. Da agência de publicidade que fez a campanha com bandeira branca no alto do morro. Se eles desarmaram o Complexo, a probabilidade de existirem bandidos, traficantes, em atividade ou não, armados com metralhadoras e armas de grosso calibre e com munição traçante, dentro de um perímetro ocupado por três Forças militares federais, e que esses traficantes, por um motivo qualquer, ou por um surto psicótico coletivo, decidam ir para o meio das ruas da favela disparar tiros na hora de maior movimento porque estão convencidos que, nunca antes na história desse país, estiveram tão preparados para enfrentar o contigente militar, é uma insanidade absoluta, e ao mesmo tempo, se isso fosse verdade, seria o atestado de incompetência do exército que permitiu uma nova entrada de armamentos ou pior, sabia da existência desses armamentos e não os retirou da mão dos traficantes, como deveriam e foram colocados lá para fazer, por completo. Mais ainda, sabiam da existência de traficantes armados e, mesmo sabendo, não fizeram absolutamente nada para evitar que a situação chegasse a esse ponto. Se o único trabalho das tropas é evitar que haja outro grupo, além deles, armado, dentro da comunidade, e que esse grupo estabeleça novamente o o terror do tráfico, e se o que ocorreu na noite de 6 de setembro foi exatamente isso, concluímos que o exército brasileiro é um amontoado de incompetentes filisteus.

2. O episódio ocorrido num bar, domingo á noite, dois dias antes desse episódio, onde foram registrados, em vídeo pelos moradores, os excessos cometidos pelas tropas militares que no dia seguinte tentava-se justificar dizendo que eles são preparados para guerra e, por isso, podiam agir como bichos. Declaração que nos faz pensar se as Forças militares são realmente instiruições ordeiras. Esse episódio reprimiu, segundo a imprensa, pessoas que estavam num bar assistindo uma partida de futebol através de um aparelho televisor  em volume máximo, e acompanhavam  em altos brados, incomodando os vizinhos. Tal atitude dos moradores justificou os balaços de borracha, o spray de pimenta e o deslocamento de quase 100 homens fortemente armados que se dirigiram violentamente contra moradores, resultando em feridos e uma mulher atingida na boca pelos militares.

O segundo erro nem é, e deveria ser, o fato isolado. Mas, a questão é mais profunda. Em todas as áreas ocupadas, os moradores são vigiados e controlados em sua liberdade de ir e vir pelas tropas, festas e encontros devem ser antes notificadas por escrito ou verbalmente e autorizadas pelo comandante da área. Até mesmo festas em residências precisam ser informadas. Algum sociólogo saberá que nome dar a isso. Mas o Alemão, ou as áreas ocupadas, não são áreas de guerra declarada, na forma da lei, não são campos de concentração, não há dispositivos legais, constitucionais, que admitam a privação das liberdades individuais nos casos de ocupação policial ou militar senão em períodos de guerra ou, como já conhecemos, em casos excepcionais, como os que aconteceram na ditarura. O erro das ocupações é criminalizar o morador. Criminalizar sua liberdade, seu direito de ir e vir para qualquer outro lugar que não seja o trabalho ou a escola, criminalizar sua cultura, suas reuniões, suas festas e manifestações coletivas. Não há articulação eficiente nessas áreas e, mesmo que agora haja, muitas marcas já foram feitas na memória e na vida dos moradores. O erro é tratar as áreas ocupadas, já excluídas, como áreas de exclusão. Daí, estranho seria se os moradores abaixassem a cabeça para os soldados que desligaram na marra a tv no bar. Estranho seria um vídeo em que os moradores não reagiriam, nem sequer uma palavra, diante da ação do exército. E voltassem todos para suas casas, calados. Isso seria, no mínimo, assustador. Mas, como não foi isso que aconteceu, é possível que a tropa tenha protestado internamente, baseada no argumento de que fora desmoralizada publicamente. Conhecendo o espírito-porquismo do exército brasileiro, como conhecemos, de não "levar desaforo pra casa", porque são machos, seria pouco provável que o episódio de domingo ficasse por isso mesmo.

3. Nessa mesma linha, considerando então a incompetência do exército em deixar bandidos armados até a boca dentro da favela, a relação nenhum pouco afetiva com a comunidade nesses últimos 8 meses, prorrogados até 2012, e a "desmoralização" da tropa pelo povo no bar domingo à noite, já podemos ter uma idéia de como esse fato de 6 de setembro está relacionado numa cadeia de acontecimentos, orquestrados ou não, frutos de uma série de infelizes ações do Estado.

Na hora do rush, todos voltando para casa, o exército fecha ruas e inicia-se forte tiroteio. Do nada. Ninguém viu movimentação de bandidos antes, não houve relato de nada anormal na comunidade durante as 2 horas que antecederam o tiroteio, a menos que, e pode ser isso que o exército quer que pensemos, todos na favela estão macomunados com bandidos e por isso não relataram a ação deles.

Tiroteio em favela é algo que o morador aprende a identificar antes que aconteça, assim como chuva. Todos que já moraram ou moram em favela sabem que um tiroteio não começa do nada. A movimentação nos 30 minutos antes de um conflito é vista por muitas pessoas e essa informação corre, cifrada, por toda favela, numa velocidade que rede social nenhuma reproduz. É impossível acontecer um evento desse porte na favela sem que a informação tenha sido transmitida para alguém, ou alguns. Mesmo os bandidos, e principalmente eles, no Alemão e em outras comunidades, soltam a informação que vai ter confronto. "Atividade aí." Basta dizer isso, e todos se mobilizam, como se fosse o aviso de um furação. Isso, de fato, não aconteceu. Os tiros surgiram. A ordem dos fatos pareceu programada por alguém que sabia do impacto que essa informação teria na mídia e principalmente na comunidade, gerando pânico.

Ninguém está acusando o exército de ter programado os fatos. Os fatos é que se mostram, todos eles, atípicos, para uma ação de bandidos. Aliás, bandidos, se é que existem e portam armas no Alemão, uma vez que o exército está lá, blá, blá.

4. No dia anterior, no horário próximo ao tiroteio, foi exibido um vídeo revelador, feito pelo exército, (que, como força de pacificação tem sido um ótimo videomaker), mostrando supostos traficantes, vendendo drogas, supostamente no Alemão. Traficantes sem o habitual bigode, sem armas, todos de camisa, de costas pra câmera e o único que está de frente aparece com um providencial boné, e comprando drogas passadas de mão em mão que, na verdade, poderiam ser chiclé de bola, uma vez que não é mostrado o que eles tem na mão. É tanto "supostamente" no vídeo que é possível inscrevê-lo num festival de curtas na categoria ficção. E é uma tentativa do exército em embasar seus argumentos, o principal deles, de que havia bandidos no Alemão. Terrivelmente armados. Contra os quais ele, exército, foi bravio e heróico.

5. Quem pode explicar a sequência de tiros para o alto, a esmo, exibidos no vídeo feito por um morador? Quem o quê queria atingir o responsável pelos disparos? Qual a estratégia, observando os princípios da física, tinha o atirador ao mandar bala para Vênus? Bandidos atiram para o alto sabendo que estão cercados por homens armados em terra?

6. A nota do exército foi feita por algum comediante. Daqueles ingleses, com humor mesquinho. Diz que houve sim a troca de tiros, que traficantes atiraram contra homens do exército, etc, etc, e teremos que considerar a fúria e loucura criminosa, a existência de armas a incompetência do exército, os traficantes atirando para o alto porque perderam os óculos, etc.

Mas, é uma nota do exército, poxa vida. Agora sim, a sociedade sabe de verdade o que aconteceu. O exército não mente. Nunca mentiu. Nunca emitiu notas delirantes. Segundo as notas do exército, Herzog se matou, Dilma é terrorista e a revolução de 64 foi um sucesso.