O telefone toca preciso às 4:30 da manhã de sábado, 19 de junho.
Fomos cobrir a ocupação da última comunidade que pertence ao "cinturão de segurança do Maracanã".
Nos encontramos no Centro do Rio, uma hora depois. Muito embora soubéssemos qual seria o provável roteiro da ocupação, sempre existe uma margem para cogitarmos um imprevisto. No táxi, deliberamos sobre isso.
Vários acessos fechados no entorno da Magueira. O taxista entra no retorno para a Marechal Rondon, sentido Centro, e nos deixa a 500 metros da Escola de Samba Mangueira (Foto).
Seguimos andando por este viaduto de acesso e, de cara, percebemos 3 helicópteros.
Particularmente, considerei uma medida excessiva e cenográfica. Se a situação estava sob controle, não vejo porquê acordar os moradores com o ruído ensudercedor das turbinas dos helicópteros,
Essa fumaça nas proximidades da Rua Ana Neri não foi comentada por ninguém. Confesso que tive até receio de publicá-la.
Foi a primeira vez que acompanhei uma ocupação com minha Sony HX1, semipro, mas limpinha. Todos em volta de mim usaram bazucas Canon, Kodak, Nikon. Lentes com cilindros do comprimento do meu braço.
Andamos pela principal rua de acesso e o que eu vi foram ruas vazias. Apenas um bêbado na rua, camisa do Olaria, gritando: "Coé, da Globo, eu que sei do bagulho." Na verdade, ele, Cecília e eu éramos o público mixo para a ocupação empombada.
Mas vi, em suas casas, moradores assutados, nas janelas e varandas e, deles, não tirei foto. Alguns com velas acesas nas janelas, imagens de Nossa Senhora, calados, quietos, o que lhes restava: uma oração aos pés da cruz, diante de mais uma novidade que o futuro dirá a que veio.
Vários razantes. Fiquei na mira do CORE e do BOPE até gastar a vista do Sniper. Passavam, e passavam, baixo. Se eu levantasse a mão, ficava maneta.
Alguma imprensa presente, 10, 12 jornalistas da mídia impressa e uma equipe de filmagem da Globo, com seus coletes azuis. Caminhavam de um lado para o outro. Passaram também dois tanques na Marinha, tão rápido que parecia racha. Depois, não vi mais nenhum.
Trocamos conversas com alguns jornalistas, havia poucas informações sobre onde-quem-que horas.
Então, decidimos entrar na Mangueira. Na rua vazia, olhei pro alto da favela, respirei, e fui.
Sorte minha que nessas horas Cecília é macho pra caramba. Entra nas vielas, sem suar uma gota.
Encontramos esses dois Bopeanos na primeira rua. Por um momento, achei que eles iam embaçar nossa subida, para o Parque da Candelária, caminho destemido que fizemos por dentro, e não pelo asfalto, como todos da imprensa fizeram.Não falaram nada, eu também, fui em frente.
Metade do caminho, essa foto é no alto de um escadão, meia hora de subida. Haja perna.
Já quase no final do caminho, desse ponto dava pra ver a cor dos olhos dos policiais nos helicópteros. E uma visão incrível da Tijuca.
Trupe de fotógrafos e jornalistas (Cecília de mochila), que estavam, alguns, acompanhando homens do Bope, outros, procurando por informações.
Nesse ponto, um destacamento de homens do BOPE aguardavam a chegada de outros policiais. Mais ao norte, o Marco Zero, a caixa d´água onde foi fincada a bandeira.
Após subir na caixa d´água, descer, subir de novo, fritar até 10 da manhã e descobrir que Beltrame não subiria na favela, mas daria uma coletiva "lá embaixo", decidi que minha missão já havia sido cumprida. Cinco horas, 200 fotos, algumas conversas com homens do Bope e 4 bananadas depois, resolvi descer.
Fato que, no local, você ouve e troca muita informação valiosa. Mas isso, já uma outra história.
Voltei pra casa refletindo em algumas coisas que por muito tempo ainda não irei compartilhar.
Fiquei com uma sensação "meia-boca" nisso tudo. O que me traz um sentimento de que já vi essa novela no Rio. Queira Deus que eu esteja errado.
Essa semana, volto lá, dessa vez no Centro Cultural Cartola, para conhecer os focais e tentar mobilizar pessoas em torno de algum projeto.
Afinal, a vida real acontece no hiato compreendido entre um holofote e outro.